AIAFA News Digital entrevista Beto Marcelino, sócio-fundador do iCities
O modelo multimodal de Barcelona esteve em foco durante o Smart City Expo World Congress, evento internacional sobre inovação urbana, realizado no início do mês. E a mobilidade é uma das áreas de interesse de Beto Marcelino, sócio-fundador e diretor de relações governamentais do iCities.
O iCities é um hub de cidades inteligentes e detentor da chancela da Fira Barcelona no Brasil. Junto com a Global Business Inovation Intelligence, de Carlos Olsen, foi um dos organizadores da participação da Comitiva Oficial Brasil no evento.
Nesta entrevista à AIAFA News Digital, Marcelino observa que existe uma grande preocupação em melhorar a caminhabilidade no mundo. "Muitas pessoas não caminham em função da qualidade da infraestrutura viária. Calçamento, ruas, arruamento, tudo isso é feito com primor na cidade de Barcelona e deve ser exemplo para várias outras cidades do mundo", diz.
A reportagem conversou com o diretor do iCities para saber quais impressões sobre a mobilidade urbana de Barcelona ele leva para o Brasil. Veja na entrevista a seguir.
O senhor acha que o modelo de mobilidade urbana de Barcelona é exportável para as cidades brasileiras?
Sim. O modelo multimodal que Barcelona adota - administrado pela empresa Transports Metropolitans de Barcelona (TMB) em uma ação que conjuga o transporte público com ônibus, VLT, metrô, com os táxis - é um sistema que trabalha de forma integrada. Você conta com uma disponibilidade enorme, dentro das possibilidades de uso: se você vai para áreas mais próximas ou mais extremas da cidade, se você tem que caminhar, se está chovendo. A TMB conseguiu fazer uma gestão multimodal muito voltada para o conforto do cidadão. Tem um aplicativo que você pode acessar e saber os horários exatos que os ônibus estão passando, horários exatos do metrô e do VLT. Isso facilita muito a vida, porque você não perde tempo esperando o transporte público passar. Também a qualidade do transporte público, equipamentos novos, equipamentos com Wi-Fi, tudo isso facilita a vida agitada do dia a dia. Então, acho que é um bom modelo e é exportável.
"O maior desafio para termos uma mobilidade urbana como a de Barcelona é melhorarmos a nossa gestão de frotas no Brasil"
Qual o maior desafio para ter um sistema de mobilidade como o de Barcelona?
O desafio é ter essa gestão. Uma empresa enorme como a TMB tem a gestão muito voltada à qualidade do serviço, e isso muitas vezes é precário no País. Ter todo o controle digital da frota, os horários, carros elétricos, carros híbridos, como se faz a gestão de energia, como carregar toda essa frota, eles fazem isso de forma impecável. O maior desafio é melhorarmos a nossa gestão de frotas no Brasil.
Que cidade brasileira o senhor considera um bom exemplo de mobilidade?
A cidade de Curitiba tem um modelo exemplar de transporte público, que é o metrô de superfície chamado BRT (bus rapid transit), que está implementado em mais de 100 países. Várias cidades no Brasil adotam esse sistema, como o Rio de Janeiro. O BRT carioca vem funcionando muito bem, por mais que a população venha achando outras formas de se locomover na origem/destino, como motos, bicicletas e aplicativos de mobilidade – como Uber, 99 e outros.
O sistema de transporte em Curitiba, a forma como todo o esquadrinhamento foi projetado, o projeto em si, que corta a cidade de norte a sul, de leste a oeste, é fundamental para transportar milhares de pessoas por dia, com eficiência, com agilidade. É um bom modelo, que o Brasil vem adotando já em outras cidades e que vem crescendo. Então considero que Curitiba hoje é um modelo nessa área de transporte público.
Ainda em relação à mobilidade, que conhecimentos e insights vocês levam daqui de Barcelona?
Eu destacaria três pontos:
- Micromobilidade – Do Tomorrow.Mobility, evento dentro do Smart City Expo World Congress, que está na sua 14ª edição, acredito que seja imperativa a questão da micromobilidade. Os eventos apoiam muito essa questão da infraestrutura viária, uma infraestrutura completa e perfeita em relação ao tratamento de calçadas e pisos, do rebaixamento de guias. Tudo isso facilita que você tenha uma mobilidade ativa muito maior. Uma preocupação pertinente hoje no mundo é melhorar a caminhabilidade. Muitas pessoas não caminham em função da qualidade da infraestrutura viária. Calçamento, ruas, arruamento, tudo isso é feito com primor na cidade de Barcelona e deve ser exemplo para várias outras cidades do mundo.
O Rio de Janeiro vem adotando isso na área do Porto Maravalley. Em Porto Alegre, o Pacto Alegre ajudou na constituição de um projeto de melhoria de toda a infraestrutura da área do Guaíba, na região próxima ao Mercado Público de Porto Alegre. Na cidade de Curitiba, os parques são um estímulo para caminhar, andar de bicicleta, usar a micromobilidade. - Serviço de shuttles: Também a adoção dos shuttles, que são uma espécie de micro-ônibus sem motorista, são autônomos, elétricos, compartilhados e conectados. Eles fazem o chamado last mile, a última milha, em áreas centrais, áreas de aeroportos ou áreas em que as pessoas possam se locomover com segurança, sem poluir o ar, de forma autônoma e moderna. Estão adotando esse sistema e levando isso para outros lugares.
- Compartilhamento: Acreditamos muito nos negócios que adotam o sharing, tanto os sistemas de bike sharing, como os patinetes e outros micromodais em compartilhamento. Barcelona tem muitas lojas que alugam todo tipo de equipamento para você se locomover, desde skate, skate elétrico, patinete, bicicleta, scooter, microcarros. Percebemos que isso é um bom negócio, que eu acho que o Brasil precisa olhar. E já apareceram empresas que estão fazendo isso no Brasil também.
Como as empresas podem se engajar para promover uma mobilidade mais sustentável?
Vou citar alguns exemplos:
- Caronas solidárias - As empresas, de forma geral, já há algum tempo no Brasil adotaram, por exemplo, o sistema do Waze Carpool, que era um serviço de caronas solidárias.
- Grade horária flexível - Há empresas flexibilizando os horários de trabalho para tirar seus colaboradores dos horários de rush, melhorando a qualidade de vida dessas pessoas. É apenas um ajuste na grade horária de trabalho e isso não implica diminuir produtividade, pelo contrário.
- Banheiros com duchas - Outro ponto é o incentivo dos escritórios que oferecem banheiros com chuveiros para a pessoa que vai adotar o uso da bicicleta ou caminhabilidade.
- Estímulo à eletromobilidade - Também há empresas disponibilizando vagas para veículos elétricos de maneira geral, seja moto, bicicleta, scooter, carro, van. Isso é um estímulo à eletromobilidade e à descarbonização. E em fim de ano, já vi empresas sortearem bicicletas elétricas, incentivando os colaboradores a praticarem atividade física e tudo mais.
Nós incentivamos bastante a caminhabilidade e o uso do transporte público de maneira geral. E estamos lutando muito para a melhoria desses modais em Curitiba.
Texto: Liana Aguiar